Futebol

18 novembro 2022, 17h15

Roger Schmidt

Roger Schmidt

ENTREVISTA

A cidade do Porto recebe por estes dias a 1.ª edição do "Thinking Football Summit", evento internacional de discussão e reflexão sobre futebol. O treinador do Sport Lisboa e Benfica, Roger Schmidt, foi um dos intervenientes e teve a oportunidade de analisar os primeiros cinco meses ao serviço do Clube, numa entrevista realizada no Benfica Campus.

Na primeira época na Luz, o técnico alemão representa a equipa que ostenta a liderança da Liga Bwin e que terminou a fase de grupos da Champions no 1.º lugar. Roger Schmidt vê também o Benfica na discussão pelas Taças de Portugal e da Liga, e tudo isto sem derrotas em 25 jogos oficiais.

Na entrevista, Roger Schmidt partilhou a opinião que tem sobre a Liga portuguesa; elogiou a aposta feita nos futebolistas jovens pelo Benfica e não só; recordou o trajeto positivo das equipas lusas nas provas da UEFA em 2022/23 e vincou que se sente feliz a viver em Lisboa.

Roger Schmidt

LIGA PORTUGUESA COM MUITA QUALIDADE

"Eu já tinha uma opinião sobre o futebol português, visto que já joguei contra equipas portuguesas na Liga dos Campeões e na Liga Europa. E foram sempre jogos complicados. Mas, para ser sincero, eu tenho uma mente muito aberta quando inicio funções noutro país. Interesso-me pela cultura do país, no geral, mas também pela cultura futebolística. É também por isso que gosto de trabalhar no estrangeiro. Assim que cheguei aqui, quis obter informação sobre os meus jogadores e perceber o seu mindset e a sua forma de trabalhar. E, claro, no início da época, comecei a entender melhor as outras equipas. Assim que começamos a preparar um jogo contra uma equipa portuguesa, fazemos uma análise e daí obtemos uma nova perspetiva. Jogo após jogo, esse estilo de jogo torna-se mais claro e o que posso dizer após cinco meses é que esta é uma competição muito difícil, comparando com outras ligas onde já trabalhei. Cada preparação para um jogo é um desafio, mas por vezes surpreendemo-nos durante o jogo em si, porque a abordagem das equipas acaba por ser diferente do planeado. E algo que já notei, especialmente no aspeto defensivo, quando se joga contra equipas que não se encontram no mesmo nível das equipas grandes como o Benfica, o FC Porto ou o Sporting, estas são, mesmo assim, muito bem organizadas, bastante destemidas. Na minha opinião, são muito boas a defender. Essas acabam por ser as minhas primeiras impressões, ao fim de cinco meses a competir na Liga portuguesa."

Roger Schmidt

"Assim que cheguei aqui, quis obter informação sobre os meus jogadores e perceber o seu mindset e a sua forma de trabalhar. E, claro, no início da época, comecei a entender melhor as outras equipas"

Roger Schmidt, treinador do Benfica

PORTUGAL E AS OUTRAS LIGAS

"É muito difícil comparar uma Liga com outra. Já é complicado fazer comparações entre as equipas da Liga portuguesa. Por isso, comparar uma Liga, no seu todo, com outra... É algo difícil para mim. Como disse anteriormente, [as equipas] acreditam sempre que têm as suas hipóteses. O que sinto é que acreditam que podem ganhar. Não ficam sequer contentes se 'só' perderem por poucos golos. Este é o primeiro ponto. E depois depende de como se desenrola o jogo em si. Se marcamos cedo, torna-se naturalmente mais fácil. Mas se não marcamos e eles acabam por marcar, aí a tarefa torna-se mais complicada. Também por aquilo que disse há pouco, porque são muito boas defensivamente, especialmente numa defesa atrás, na zona fora da grande área. É algo que já reparei. Noutros países, quando se joga contra equipas que se encontram em zonas inferiores da tabela, sente-se que não acreditam verdadeiramente que podem vencer o jogo. Acho que esta é uma das diferenças para com outras Ligas."

Roger Schmidt

A VANTAGEM DE APOSTAR NOS JOVENS

"É uma filosofia clara do Benfica, o desenvolvimento do jovem jogador para conseguir jogar na equipa principal. E se forem efetivamente bons, serem vendidos, e assim continuar a fomentar também esta filosofia de gerar dinheiro para que o Clube se mantenha altamente competitivo a nível europeu. Acho que é uma filosofia fantástica porque, para cada clube, é um valor imenso que os jogadores da formação possam subir à equipa principal. É um fator identitário para o clube, mas também para os adeptos. Por exemplo, os adeptos do Benfica gostam de ver os jogadores da formação a jogar na equipa principal, pelo menos alguns deles. É certo que não podem ser só eles. Se queremos ser competitivos na Liga dos Campeões, ou nas fases de acesso, não podemos jogar só com os miúdos da formação. Isso seria difícil. Mas termos alguns na equipa é muito bom. É algo que gosto de ver. E acho que essa deve ser a política em todos os clubes, a de ter alguns desses jogadores nas suas equipas. Alguns clubes não conseguem fazê-lo. Mas num clube como o Benfica, ou outros clubes em Portugal, ou na Europa, em que desenvolvem de forma contínua os jovens jogadores para que estes sejam aposta nas equipas principais, é um sinal forte para a cultura do clube. E acho que é algo que acrescenta qualidade. Esta também foi uma das razões que me fez vir para aqui, para trabalhar com estes jogadores."

Roger Schmidt

"Nunca é fácil jogar contra equipas portuguesas. E no último ano tornou-se ainda mais difícil. Posto isto, acho que o futebol português caminha na direção certa"

FUTEBOL PORTUGUÊS EM BOA POSIÇÃO NO CONTEXTO EUROPEU

"Portugal é um país incrível, mas de dimensão pequena, com cerca de 10 milhões de habitantes. Logicamente, o número de jovens talentos é menor que noutros países. A Alemanha tem 70 milhões de habitantes. Não sei precisar o número de habitantes noutros países, mas certamente será maior que em Portugal. O lugar que Portugal ocupa, neste momento, no contexto europeu, é muito bom. E acho que continua a melhorar. Como as nossas melhores equipas, o FC Porto e o Benfica, e claro, o Sporting, que quase permitiu termos três equipas portuguesas nas fases a eliminar da Liga dos Campeões. Podemos olhar para o caso de grandes equipas que não se conseguiram qualificar, já pela segunda vez consecutiva, como é o caso do Barcelona. Equipas de grande valia... Por isso, aquilo que se passa em Portugal já é bastante positivo, mas há sempre espaço para melhorarmos. E parte deste crescimento vem da capacidade de a Liga portuguesa se manter altamente competitiva. Isso afeta e ajuda a melhorar esse crescimento a nível europeu. Mas eu consigo ver isso, consigo ver o potencial, a forma de se jogar em Portugal é muito boa. E se as equipas grandes continuarem a competir a nível internacional... Aqui, junto o SC Braga, que tem feito grandes campanhas. Na minha opinião, nunca é fácil jogar contra equipas portuguesas. E no último ano tornou-se ainda mais difícil. Posto isto, acho que o futebol português caminha na direção certa."

Roger Schmidt

VIVER EM PORTUGAL

"Senti-me muito bem recebido. Os portugueses são muito acolhedores e muito positivos. Sinto uma energia positiva muito forte no País, especialmente na cidade de Lisboa, que é onde estou a maior parte do tempo. Tenho gostado muito de viver e trabalhar aqui. Foi, sem dúvida, uma das melhores decisões que já tomei na vida."

Roger Schmidt

EVENTOS COMO O "THINKING FOOTBALL" SÃO IMPORTANTES

"É muitíssimo importante haver esta troca de ideias. Pessoas que se sentam para debater temas importantes para a indústria do futebol. Acho que é fundamental para o seu desenvolvimento. Se queremos desenvolver algo, por exemplo, em relação aos próximos passos a tomar no futebol português, como é óbvio, é necessário que estas pessoas debatam sobre o tema. É necessário que se reúnam e pensem nos próximos passos. Acho que é algo muito importante para o futebol. Também estive presente no encontro com a UEFA, onde se puderam debater vários assuntos. Por isso, isto é algo que possui bastante valor."

Roger Schmidt

"Gosto de estar todos os dias com os jogadores, juntamente com o staff técnico, e trabalharmos para estar na melhor forma nos dias de jogo. Fazer com que os adeptos se sintam felizes e orgulhosos"

ROGER SCHMIDT: O HOMEM E O TREINADOR

"No meu dia a dia, sou tal como sou enquanto treinador. Não tento ser diferente. Acho que o importante no futebol, e enquanto treinador, é ser-se genuíno, o que torna as coisas mais fáceis para nós mesmos. Se adotarmos uma persona, torna-se mais complicado. Faço os possíveis para continuar a gostar de futebol, como na altura em que era jogador. E quero continuar a ter prazer nisso. Sei que, no futebol, isso depende sempre do sucesso das equipas. No Benfica, isso significa lutar sempre por títulos. Gosto de estar todos os dias com os jogadores, juntamente com o staff técnico, e trabalharmos para estar na melhor forma nos dias de jogo. Fazer com que os adeptos se sintam felizes e orgulhosos. Essa é a minha maior motivação. Eu sou o que sou. Não finjo ser outra pessoa. Claro que faço sempre essa diferenciação quando estou com os jogadores. Tenho de treiná-los e geri-los como jogadores, mas por detrás de cada jogador há um ser humano. Tento ver sempre essa parte. Porque se queremos os jogadores ao mais alto nível, eles devem sentir-se felizes e relaxados, e é por isso que devemos ter a noção de que há alguém mais por detrás de um jogador."

Texto: Redação
Fotos: Arquivo / SL Benfica
Última atualização: 21 de março de 2024

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