"Já perdi a conta aos títulos pelo Benfica"

Em abril, Samuel Barata vai precisar da sua melhor e mais bem preparada versão, quando correr a Maratona de Roterdão. O atleta do Benfica tem uma ambição definida para essa prova. Igualar ou melhorar o tempo de Carlos Lopes, que, há 40 anos, na primeira edição dessa prestigiada maratona, bateu o recorde mundial.

Para o vencedor do Campeonato Nacional de Meia-Maratona, que decorreu em simultâneo com a Meia-Maratona de Lisboa, o recorde de Carlos Lopes ainda é algo que os maratonistas portugueses nunca conseguiram igualar. Ou melhorar.

Na sua conversa comigo, no programa Protagonista e já depois da gravação, resultou esta convicção de que melhorar essa icónica marca seria uma espécie de medalha pendurada no peito, invisível aos olhares alheios, mas bem presente no seu arquivo de melhores memórias da carreira.

MEIA-MARATONA

"Foi uma vitória importante, porque esta era a segunda edição do Campeonato Nacional de Meia-Maratona e foi a primeira vez que um atleta do Benfica a conquistou. No ano passado, foi um atleta do SC Braga, e faltava-nos este título. Senti-me bem, consegui ir no encalce dos atletas africanos, durante 14 ou 15 km, o que me permitiu ganhar uma boa vantagem sobre todos os outros atletas nacionais e que disputavam comigo o título nacional. Claro que, nos quilómetros finais, tive de deixar ir os atletas africanos e terminei em 9.º lugar, sendo o melhor atleta nacional, o que me permitiu vencer o Campeonato Nacional e entregar mais esse título ao Benfica. Era muito importante, para mim e para o Clube, depois de outras vitórias importantes do Clube já nesta temporada."

HEGEMONIA BENFIQUISTA

"Tem sido um ano muito bom para o Benfica e para os seus atletas. O calendário nacional tem algumas provas que são as principais. O Nacional de 10 km de Estrada, o Nacional de Corta-Mato, os Nacionais de Pista Coberta e os Nacionais de Pista ao Ar Livre. O Benfica tem conquistado esses títulos. Em fevereiro, fomos campeões de estrada, fomos vice-campeões europeus de corta-mato, e o Benfica foi campeão europeu de estafetas mistas. Também fomos campeões nacionais de pista coberta, e temos o objetivo de voltar a conquistar o título de pista ao ar livre. Temos uma equipa com imensos valores, alguns mais experientes, como eu, e vários atletas a despontar, com um futuro brilhante pela frente. Tudo isto é fruto de muito trabalho e de um projeto que o Benfica implementou e que é liderado pela professora Ana Oliveira, que é a mentora desta hegemonia clara do Benfica. Quando ela chegou ao Clube, não era assim."

ESTAR EM TODAS

"É o que distingue os atletas do Benfica. Corremos por nós, pelas marcas, pelas vitórias, pelas medalhas, mas corremos pelo Benfica. É por isso que o nosso planeamento não pode ser feito a pensar nas provas que são importantes para nós, como Mundiais ou Europeus e Jogos Olímpicos, mas também a pensar nas provas que o Benfica disputa e em que luta para ganhar. Eu considero-me um maratonista, mas na pista corro os 10 mil metros para ajudar o Benfica a conquistar pontos para ser campeão; na estrada, fiz parte da equipa que venceu o Nacional dos 10 km, estive na equipa de corta-mato que foi campeã e estive agora na meia-maratona. E faço-o sabendo que é impossível estar no meu melhor momento de forma em todas as provas. Mas tenho de ajudar o Benfica. E também é por isso que perdi a conta a todos os títulos e medalhas conquistadas pelo Benfica, nas mais diversas provas nacionais. Mas correr pelo Benfica é uma espécie de aditivo, dá-nos força, quando ela começa a faltar."

TAÇA DOS CAMPEÕES EUROPEUS

"É uma pena que a pandemia tenha acabado com essa competição. O Benfica, pelo que aposta na modalidade, merecia disputar e vencer uma prova dessas. A Federação Internacional aposta, agora, nas ligas, e não sei quando será possível organizar, de novo, a Taça dos Campeões Europeus. Mas acredito que será uma questão de tempo até voltarmos a ter essa competição. Sei que os clubes, como o Benfica, têm tentado incentivar a Federação Internacional a recuperar a Taça dos Campeões, e, quando o fizer, o Benfica lá estará, para a disputar e tentar ganhar. Temos uma das melhores equipas da Europa em atletismo. Sobre isso, não tenho dúvidas."

IGUALAR CARLOS LOPES

"Vai ser em abril que se vai disputar a Maratona de Roterdão, que é uma das maratonas mais reconhecidas do mundo. Mas, neste ano, será uma edição especial, porque se cumprem 40 anos sobre a primeira edição e, ao mesmo tempo, 40 anos sobre o dia em que o Carlos Lopes, nessa maratona, bateu o recorde mundial da maratona. Seria muito especial, para mim, igualar ou bater essa marca de Carlos Lopes, em Roterdão. Claro que o objetivo, agora, não é bater o recorde mundial, mas, se conseguisse igualar essa marca histórica de Carlos Lopes, seria algo de que me orgulharia imenso. Deitar-me, nesse dia, a pensar que igualei ou melhorei essa marca de Carlos Lopes seria indiscritível para mim. Vou agora cumprir um estágio em altitude, para chegar à maratona no meu pico de forma, e, depois desse estágio, aliviar um pouco as cargas, para chegar levezinho à prova. O traçado é bom, creio que, se estiver num dia bom, posso concretizar os meus objetivos."

MUNDIAIS DE SETEMBRO

"Esse é outro dos grandes objetivos deste ano, não esquecendo que, antes dos Mundiais, teremos os Nacionais de Pista ao Ar Livre, onde o Benfica, nos masculinos, pretende vencer, mais uma vez. E será marcante que o façamos, porque é a única das principais provas coletivas da temporada que o Benfica ainda não conquistou. De resto, vencemos tudo. Pista coberta, crosse e estrada. Tem sido um ano incrível para o Benfica, em atletismo, e queremos fechar com chave de ouro. Depois, sim, posso concentrar-me nos Mundiais, e aí vou tentar ficar no top 20. É a minha grande ambição, e acredito que tenho condições para o conseguir, fazendo uma boa preparação, estando bem nesse dia. E tenho de fazer uma boa recuperação, depois dos Nacionais, para me apresentar nos Mundiais no melhor momento de forma possível."

JOGOS OLÍMPICOS

"Era um dos grandes objetivos da minha carreira, e consegui cumpri-lo no ano passado. Mas nada correu como eu esperava. Dois meses antes dos Jogos Olímpicos, ainda estava a recuperar de uma lesão. Não tive tempo para me preparar da forma mais conveniente, e foi pena. Fui para os Jogos Olímpicos sabendo que seria muito difícil cumprir o meu objetivo de ficar entre os 30 primeiros e, mais dificilmente, nos 20 primeiros. A prova confirmou as minhas piores expetativas, e corri com muito sacrifício, tentei dar o meu melhor, apelando a todas as minhas forças, mas foi, realmente, uma prova muito dura para as minhas capacidades, nessa altura. Eu nunca falei disto publicamente, para que as pessoas não achassem que me estava a desculpar, mas esta é a verdade. Tenciono estar nos próximos Jogos Olímpicos, e aí, com a preparação ideal, quem sabe se consigo estar ao meu nível e obter uma classificação bem melhor?"

POUCO MEDIATISMO

"É uma pena que o atletismo tenha pouca relevância mediática em Portugal. Não sei porque é que isso acontece, porque, depois, quando há Jogos Olímpicos ou Mundiais, as pessoas interessam-se. Portanto, não é por falta de interesse do público, até porque, se houver mais interesse dos media, eu acredito que as pessoas vão aderir. O atletismo é a modalidade-rainha dos Jogos Olímpicos, e isso não acontece por acaso. É uma modalidade com mais impacto e seguidores que muitas outras, em todo o mundo. Em Portugal é que tem sido pouco acarinhada, e é pena. Temos grandes atletas, trazemos medalhas para Portugal, mas, mesmo assim, continua a haver pouco interesse mediático. E, por interesse mediático, não me refiro a transmissões de streaming, que, geralmente, são muito fracas. As televisões deviam olhar mais para o atletismo, porque as pessoas gostam da modalidade."