Clube

16 abril 2024, 23h37

Benfica sempre pela liberdade

Benfica sempre pela liberdade

REPORTAGEM BTV

O auditório do Museu Benfica – Cosme Damião recebeu, nesta terça-feira, 16 de abril, a tertúlia "Benfica Sempre pela Liberdade", que contou com a presença de Alberto Martins – antigo presidente da Académica de Coimbra –, do maestro António Victorino d'Almeida e de João Malheiro, e recordou os tempos em que o Clube foi um oásis democrático em Portugal.

Olhando e lembrando a ditadura que vigorou em Portugal entre 1933 e 1974, e para a forma exemplar e livre como o Glorioso sempre se posicionou, muitas e boas figuras da história do Clube e do país juntaram-se para recordar a veia democrata e íntegra que sempre imperou no Sport Lisboa e Benfica.

Também no âmbito dos 120 anos do Clube e do 50.º aniversário do 25 de Abril, o Benfica, o auditório do Museu Benfica – Cosme Damião recebeu nomes como Toni, Shéu Han, José Augusto, Vítor Martins, André Lima, Tinoco Faria, António Melo, Rui Melo, Carlos Areia, entre outros. Os Órgãos Sociais do Sport Lisboa e Benfica também marcaram presença.

Antes da subida ao palco, os convidados deram uma volta pelo Museu, parando nos locais que contêm referências ao 25 de Abril.

Depois de todos estarem acomodados nos seus lugares – que quase não chegavam para tanta afluência – os tertulianos subiram a um palco. Por de trás de si, tinham a Taça de Portugal conquistada pelo Benfica em 1969, uma imagem gigante do dia da Revolução de 74 e um cartaz com letras bem grandes e visíveis: Benfica Sempre Pela Liberdade.

Benfica sempre pela liberdade

Alberto Martins, presidente da Académica de Coimbra, em 1969, o maestro António Victorino d'Almeida, famoso adepto do Benfica, e ainda João Malheiro, antigo diretor de comunicação do Clube e autor do livro ‘A Cartilha da Benficofobia’, que fala da posição do Benfica no antigo regime, foram os convidados para dar voz à memória e para clarificar a história. Pedro Pinto, diretor de comunicação do Clube, foi o condutor desta animada, emocionante e surpreendente tertúlia.

Quase como que o código que deu início a esta conversa, um momento muito especial: o E Depois do Adeus, de Paulo de Carvalho, a senha que deu origem a toda a operação do 25 de Abril.

Ouvida, escutada, cantada e sentida por todos, a cantiga foi aplaudida de pé por todo auditório, incluído os câmaras e jornalistas presentes, que não ficaram indiferentes ao simbolismo do tema.

Depois de Paulo de Carvalho contar que ficou "na história sem querer", pois a música foi escolhida por gerar "menos suspeitas", por ter sido a vencedora do Festival da Canção desse ano, voz a Alberto Martins.

Ora, a presença do antigo presidente da Briosa tem uma razão muito simples, ou não tivesse sido entre o Benfica e a Académica o jogo com maior simbologia política da história do futebol português: a final da Taça de Portugal de 1968/69.

Benfica sempre pela liberdade

No epicentro da revolta estudantil, os estudantes deslocaram-se a Lisboa para uma final que não teve nem a presença dos dirigentes políticos da altura, nem transmissão televisiva, pois de Coimbra vieram também muitos e muitos protestos contra o regime.

"No fim do jogo [que as águias venceram, por 2-1], todos os jogadores de Benfica e de Académica trocaram as camisolas. Os jogadores do Benfica vestiram as da Académica, e os da Académica as do Benfica, e deram uma volta ao estádio com a taça, que foi ganha pelo Benfica. Mas, no fundo, foi uma vitória para o povo português", lembrou Alberto Martins.

A viver em Viena durante muitos anos, o maestro António Victorino d'Almeida lembrou como o Benfica lhe deu a "nacionalidade", pois o facto de ser oriundo de um país fechado numa ditadura fazia com que Portugal fosse esquecido. "Era como se ninguém soubesse que Portugal existia... Isso acabou quando o Benfica ganhou ao Real Madrid. Passaram-me a chamar 'o português'", recordou.

Ora, um ano antes do E Depois do Adeus, de Paulo de Carvalho, vencer o Festival da Canção, foi a Tourada, de Fernando Tordo – mais um insuspeito benfiquista, sócio 955 – a ganhar.

Benfica sempre pela liberdade

Também ele presente, antes de presentar a plateia com uma música com uma incontornável mensagem política – que foi ovacionada de pé –, Fernando Tordo pediu a José Augusto para dar o seu famoso grito. Este não se fez rogado e, a plenos pulmões, soltou um vibrante "Viva o Benfica".

O cantautor lembrou ainda que após vencer o Festival da Canção, que nessa noite de 1973, celebrou a conquista com "dois grandes amigos": Humberto Coelho e Toni.

Em outro momento musical, porque a música e a Liberdade andam sempre de mãos dadas, a filha de Manuel Alegre – que não esteve presente por razões pessoais –, Joana Alegre, cantou Trova do Vento que Passa, escrita pelo seu pai. No fim, a cantora disse curtas, mas certeiras palavras: "E Pluribus Unum, nessa expressão cabe a liberdade inteira".

Um dos factos presentes no livro ‘A Cartilha da Benficofobia’ prende-se com a disponibilidade imediata do Presidente Borges Coutinho dias depois do 25 de Abril.

Benfica sempre pela liberdade

João Malheiro, autor da obra, fez questão de contar uma história bem ilustrativa dos valores que sempre regeram o Sport Lisboa e Benfica: "No dia 30 de abril de 1974, o Dr. Duarte Borges Coutinho desloca-se à Cova da Moura, onde estava a instalada a Junta de Salvação Nacional, não só para apresentar cumprimentos, como para pôr o Benfica à disposição da mesma para o início do processo democrático."

Para terminar mais de uma hora de conversa à Benfica (Sempre Pela Liberdade), novo momento musical, desta feita com Bonga, um cantor que é, ao mesmo tempo, antigo atleta do Clube. Oriundo do na altura denominado "Ultramar" – mais concretamente de Angola –, antes de cantar Tenho Uma Lágrima no Canto do Olho, Bonga confessou as primeiras impressões com que ficou do Clube logo após aterrar em Lisboa. "Apercebi-me que se tratava de uma família, logo no primeiro dia em que cheguei", lembrou.

De alma lavada, com um cravo cravado numa memória mais reavivada e mais clara, todos os presentes foram para casa com um sorriso nos cantos dos lábios. Ou não fosse o Sport Lisboa e Benfica um dos maiores esteios da Liberdade e da Democracia da história de Portugal, mesmo antes de estes dois conceitos serem uma realidade no país.

Texto: João André Silva
Fotos: Isabel Cutileiro / SL Benfica
Última atualização: 19 de abril de 2024

Relacionadas